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sábado, outubro 29, 2005

 
Dizer não é importante

Não sei porque as pessoas se sentem tão angustiadas para dizerem ao mundo o que pensam sobre as coisas. Afinal de contas, quem se importa? Se Nietzsche que era Nietzsche deve ter sido ouvido só por 0,00026 por cento da humanidade (Veja, 06 de novembro de 1999, “Tuppaware, Nietzsche e elite”, Igor Fuser), o que daria a nós, semianalfabetos funcionais, o direito de reclamar por não sermos ouvidos?

Devíamos é calar a boca mais vezes. Assim, arrotaríamos menos besteiras. Eu, que escrevo unicamente quando julgo ter algo a dizer, sem compromisso com o tempo nem com o espaço, prefiro acompanhar o raciocínio de um famoso arcebispo carioca que lecionou ao então pupilo e hoje pastor Ronaldo Dedini: “Punir aqueles que dizem e fazem besteiras é um ato de misericórdia” (Veja, 12 de outubro de 1971, “Queima eles, Jesus!”, Epaminondas Filho). E é mesmo.

Exemplo disso é o eterno Coronel Erasmo Dias, coitado de Deus quando ele chegar, que censurou aqueles playboyzinhos maconheiros da PUC há algumas décadas. Os moleques queriam porque queriam gritar contra o regime. Até aí, tudo bem. Até a mulher do Geisel já estava com o saco cheio de ele ficar em Brasília (Veja, 24 de setembro de 1977, “Ela quer dar abertura”, Percival de Souza).

Mas aí resolveram interromper o trânsito e distribuir os panfletos aos motoristas. Nem Gandhi toleraria isso. Eram poucos e queriam abusar do direito de dizer, restringindo o direito dos demais a voltar para casa. Hoje, neste mundo de ongueiros e esquerdistas domingueiros, ninguém se lembra do honrado militar por sua coragem naquele momento tenso. Esquecem que a ação corretiva ímpar, eficiente e piedosa conduzida por ele poupou alguns estudantes de entrarem na luta armada (Veja, 25 de dezembro de 1990, “Dias infeliz de nossas vida”, Edson Garcia Flosi).

Pouco importou o que o movimento do militar evitou, ficando apenas a imagem da burguesia paulistana sob a punição justa por sua traquinagem de querer falar demais. Queriam gritar, mas não tinham o que dizer (Veja, 27 de fevereiro de 1977, "Camarão é a mãe!", Goulart de Andrade).

Assim sendo, calemo-nos. O silêncio é necessário. Não façamos mais blogs. Não escrevamos mais jornais. Não imprimamos mais Bíblias. Não redijamos mais manifestos. Não enviemos mais cartas. Não aleguemos que compramos Playboy para ler os artigos. Chega de dizer. A esses boquirrotos só posso pedir que calem a boca que eu quero dormir (Veja, boletim interno de outubro de 2005, Mário Sabino).

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